Rumos tomados pela Gestão Moretti preocupam o SINPAF

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Ocupar um cargo de direção numa empresa pública exige muita responsabilidade, comprometimento com a sociedade, competência, diálogo, capacidade de articulação e democracia. Infelizmente, não é isso que acontece hoje na Embrapa.

A empresa vive dias de agonia e de enormes dificuldades desde que a Gestão Moretti assumiu sua direção. Há mais de dois anos, pouco se tem a comemorar, e muito a se preocupar. Ao invés de prêmios e reconhecimentos, o cenário é de declínio e perdas, suscitando preocupação entre todos aqueles comprometidos com a empresa.

Em um exercício analítico preliminar, podemos elencar cinco de dez retrocessos que estão afetando a empresa e minando a solidez e a imagem construídas por gerações de trabalhadoras e trabalhadores. Os cinco restantes serão levantados em uma próxima nota.

  1. Processo seletivo para escolha de dirigentes da empresa

Esse é um primeiro retrocesso nevrálgico e diz respeito à legitimidade. Contrariando o salutar processo seletivo para a escolha de dirigentes, o atual presidente da Embrapa chegou ao cargo por proximidade com as ações do Ministério da Agricultura e com as políticas do Ministério do Meio Ambiente. Mas, acima de tudo, alçou ao posto por indicação biônica, sem passar por processo seletivo, conforme estabelecido para as empresas estatais.

Essa situação é constrangedora e traz no seu bojo uma séria involução, pois até bem pouco tempo atrás a Embrapa era referência de empresa pública em seleção para escolha de seus dirigentes.

Dessa forma, abre-se um precedente extremamente perigoso no sentido de aparelhar politicamente a empresa. Ou seja, daqui pra frente as(os) dirigentes serão selecionados por sua competência e comprometimento com a sociedade brasileira ou por sua adesão e subserviência política a esferas do governo de plantão?

  1. Como fazer pesquisa em meio à burocracia crescente?

O segundo ponto diz respeito à atividade-fim da empresa, a pesquisa. São de longa data as reclamações das trabalhadoras e trabalhadores quanto às condições adversas para o exercício de suas atividades. A burocracia e a ineficiência grassam em meio às exigências crescentes para a obtenção de financiamentos para se fazer pesquisa. São inúmeros relatórios e sistemas que, ao invés de facilitar o exercício da pesquisa, termina sendo mais um fardo e uma obrigação burocrática. Sem falar no controle excessivo de suas(seus) trabalhadoras(es), gerando um ambiente de desconfiança e que asfixia a cooperação e a necessária liberdade para interação e criatividade, fundamentais para o processo da pesquisa.

Quanto à pressão para autofinanciamento das pesquisas, é importante lembrar que a busca por recursos junto a órgãos como FINEP e CNPq já é algo estabelecido há anos na empresa; porém, a novidade agora é a extensão dessa busca por todo e qualquer ente privado que queira pagar, independentemente se o projeto é ou não de interesse estratégico para o país. Com isso, perdemos autonomia e poder de decisão no que devemos pesquisar para o conjunto da sociedade brasileira.

Por outro lado, em um cenário de disputa acirrada por recursos, quando pesquisadores, pesquisadoras e analistas conseguem êxito nessa etapa, começa outra grande jornada, qual seja, a de conseguir executar as pesquisas e dar andamento aos projetos.

Exemplo clássico dessa situação está acontecendo com os responsáveis pelos projetos até então administrados pela Fundação Eliseu Alves (FEA). Em meio a intensa troca de acusações entre a diretoria da Embrapa e a FEA, as pesquisadoras, pesquisadores e analistas aguardam apreensivos a solução para o imbróglio entre as duas instituições, temerosas(os) em perder recursos e de não conseguir fazer as entregas pactuadas com os agentes financiadores.

A forma como a Gestão Moretti conduziu a situação da FEA foi bastante elucidativa do seu modus operandi. Simplesmente descartou e tratou como uma estranha e indesejada a fundação que leva o nome de um dos baluartes da empresa, fundação essa que esteve por catorze anos lado a lado com a Embrapa, apoiando-a. Lamentável!

  1. Recursos públicos destinados à empresa estão minguando

O terceiro ponto a ser destacado no caos vigente, diretamente atrelado ao item anterior, diz respeito à perda significativa de orçamento para viabilizar o pleno funcionamento da empresa. Os valores destinados a investimentos e custeio da Embrapa vêm caindo assustadoramente nos últimos anos. Prova disso é que, em 2020, o orçamento executado foi o menor dos últimos dez anos.

Duas análises precisam ser feitas a partir desse fato. A primeira é a necessidade urgente da empresa ter uma atuação mais consistente e sistemática junto aos parlamentares brasileiros. Em reuniões com os mesmos, a Diretoria do SINPAF foi surpreendida com alegações que a empresa não se posiciona de forma expressiva junto a esses formadores de opinião. Mesmo entre membros da Frente Parlamentar da Agricultura, a imagem da empresa está esmaecida. Diante da fragilidade percebida nessa área, o SINPAF contratou uma Assessoria Parlamentar para subsidiá-lo na sensibilização de deputados e senadores acerca da importância da Embrapa, alertando-os sobre o papel estratégico que a empresa tem e que precisa ser sustentado por um orçamento compatível.

A segunda nos remete à necessidade de maior transparência da direção da empresa com seus trabalhadores e trabalhadoras. O discurso “está tudo bem na Embrapa” só agrava a situação, maquiando a realidade. Não está tudo bem, a empresa tem problemas de caixa e precisamos ser responsáveis para encarar esse fato e procurar, de forma conjunta, buscar alternativas e caminhos para equacionar essa situação. Alternativas essas que não passam pela entrega do patrimônio da empresa a quem quer que seja.

  1. Sem planejamento e foco, dirigentes surfam na onda dos modismos administrativos

O quarto ponto a ser mencionado é a necessidade urgente de expurgar os modismos administrativos em curso na empresa, camuflados sob o argumento de uma suposta e necessária “modernização”. A Embrapa tem vivenciado experimentalismos administrativos que têm causado muitos problemas e consumido muito dos seus já parcos recursos. Na falta de um rumo claro, sobram tentativas frustradas.

Há não muito tempo, um grupo de trabalho (GT) fez um diagnóstico e apontou caminhos para, segundo eles, uma necessária reestruturação da empresa. O resultado dessa ação foi a implosão dos departamentos da sede da Embrapa, e a criação das Secretarias, como figuras administrativas centrais. Os efeitos dessa pseudomodernização foram a sobreposição de atribuições, uma confusão generalizada quanto aos papeis e aos processos e a fragmentação do poder em pequenos feudos sob a batuta de novos xerifes, os “Secretários”.  Felizmente o processo não avançou junto às Unidades Descentralizadas. Entretanto, em uma nova onda, volta à tona o discurso de uma “necessária modernização e reestruturação da Embrapa”. E, com isso, novos experimentalismos. Não se trata, evidentemente, de ser contrário a mudanças para melhorar o desempenho da empresa, mas esses processos têm sido extremamente equivocados. Não há planejamento e nem participação, as(os) trabalhadoras(es) e os segmentos demandantes da pesquisa agropecuária pública não são consultados, numa lógica tecnocrática e autoritária. Entramos num círculo vicioso.

É importante lembrar que, também há não muito tempo, a Embrapa embarcou no modismo dos tais sistemas integrados de gestão empresarial, os “ERPs”. Sob o argumento de uma necessária modernização, a empresa pagou consultorias, adquiriu sistemas e gastou o que não podia com algo que, até o momento, não resolveu os problemas que supostamente iriam resolver. Ou seja, a Embrapa sofre com gestões que deveriam ser penalizadas por suas decisões equivocadas que geram prejuízos à sociedade.

No dia 03.06.2021, a comunicação da Gestão Moretti soltou uma nota narrando que a gestão estratégica da empresa será feita por meio de doze projetos corporativos, distribuídos entre as três diretorias. Vale a pena a leitura. É interessante perceber que, invariavelmente, os objetivos propostos contemplam as seguintes palavras-chaves: “reorganizar”, realinhar”, “revisar”, “reavaliar”, “modernizar”, “novos modelos”. Enfim, mais do mesmo, que seduz apenas os desavisados. Além disso, quase todas as ações passam pela constituição de um GT, a elaboração de um documento, de termos de referência e em mais iniciativas de caráter burocrático que, dificilmente, indicarão saídas palpáveis.

Nesse sentido, ao mesmo tempo que tenta emplacar a narrativa de uma gestão proativa e afinada, a Gestão Moretti vai patinando, inventando saídas mirabolantes, tergiversando, requentando estratégias e estabelecendo metas que mudam como biruta de aeroporto. Em outras palavras, não há luz no fim do túnel. Estamos sem rumo!

  1. Como atender exigências e demandas crescentes sem organizar a casa?

Finalmente, o quinto ponto reporta-se à necessidade urgente de reposição do quadro de trabalhadoras e trabalhadores. Não é possível que, diante da saída de profissionais no Programa de Demissão Incentivada (PDI), não tenha sido planejada ou negociada uma ação mínima voltada a essa recomposição. Isso exige, novamente, articulação, negociação e capacidade de demonstrar a importância da empresa a diversos segmentos e em diferentes espaços. A necessidade de recompor o quadro precisa urgentemente entrar em pauta de negociação com as instâncias decisórias superiores sob o risco de se ter um apagão na empresa. O equacionamento dessa questão é de caráter prioritário.

Por uma Embrapa Pública, Democrática e Inclusiva!

A situação da Embrapa é delicada e requer união e esforço coletivo. É urgente chamar as(os) trabalhadoras(es), as organizações e os segmentos interessados na pesquisa agropecuária pública, bem como as pessoas comprometidas com a Embrapa e preocupadas com seu futuro para iniciar uma reflexão coletiva sobre os rumos que a empresa está tomando. Não podemos assistir inertes à precarização da Embrapa e o descolamento de sua missão original, qual seja, fazer pesquisa agropecuária pública para o conjunto da sociedade brasileira. Vamos ouvir todos os segmentos e nossos parceiros. Vamos resgatar aqueles que foram descartados ou deixaram de ser consultados após anos de dedicação à empresa. A luta por uma Embrapa Pública, Democrática e Inclusiva começa agora. Não temos mais tempo a perder.  Essa é uma tarefa de todas(os) nós!